Os pescadores tiveram um papel essencial para evitar uma tragédia ainda maior no naufrágio que matou 22 pessoas na Baía de Marajó, no Pará, há uma semana. Foram eles que ajudaram a resgatar boa parte dos 66 sobreviventes, e também corpos e pertences das vítimas.
José Cardoso Lemos, o Zezinho, e o irmão José foram alguns desses heróis anônimos e, ao Profissão Repórter, contaram o que acharam nas águas. Entre o que recolheram, uma bolsa com R$ 5 mil, que foi entregue à polícia.
"Nós achamos sandália, mochila, carteira com documentação, dinheiro... Achamos uma bolsa que estava com R$ 5 mil, que a gente devolveu para o delegado. Uns falaram para mim: eu não tinha devolvido, porque já tinha morrido e você perdeu seu material. Eu disse: a minha consciência que vale com Deus lá em cima. Meu material estava todo na água, mas aquele monte de vida que estava ali vale mais que o meu material", afirma Zezinho.
Zezinho e os familiares estavam saindo para buscar as redes de pesca que deixaram na água quando encontraram as pessoas boiando. Como se dedicaram ao resgate, grande parte do material de trabalho foi perdida. Mesmo assim, eles não quiseram receber dinheiro pelo salvamento.
José Learte Lemos Júnior: A mãe de uma criança ligou para pedir um PIX dele para enviar um dinheiro, porque nós tínhamos resgatado a filha dela. Aí ele disse que não.
Zezinho: Eu falei que não, que dinheiro nenhum paga a vida de ninguém. E não paga mesmo vida de ninguém, dinheiro nenhum.
José: É o que tem que fazer, né? Por caridade, pela própria vontade.
Zezinho carrega no corpo as marcas de um grave acidente de barco; ele ficou dois meses no hospital com uma fratura na bacia e conta que sente dores até hoje. "Emprego não tem aqui na nossa ilha. A única coisa que tem para sobreviver é a pesca e o açaí", explica.
O pai de Zezinho também é pescador e usou o próprio barco para salvar 16 pessoas com vida e ainda tirou dois corpos da água.
"O momento mais difícil foi a gente querer salvar tanta gente e não podia, né? O barco é pequeno, vinha tanta gente sentando... Não tinha como. À noite eu nem dormi com trauma", relembra José Learte Lemos.